Saudade boa, saudade ruim



Li dia desses na Folha o texto de uma das minhas cronistas preferidas, a Mariliz Pereira Jorge. O título do texto é "Saudade boa não dói" e, ela conta sobre a experiência de ficar alguns dias longe do marido, sozinha em casa.
Pois bem, estou nesse momento tomando posse do tema dela. Me dei o direito do roubo de pauta - ainda que não seja - por estar vivendo coisa parecida. Bem parecida!

Lembro, agora, de pouquíssimas saudades boas que senti ao longo dos meus quase vinte e sete anos. Sinto saudades do meu avô e de tudo que consegui viver com ele em poucos anos. Eu era uma criança de porcelana e, ao mesmo tempo, eu o fazia dormir contando histórias e fazendo massagens, como se fosse gente grande. Sinto saudades disso, com todo meu coração. E honestamente, não sei se isso é uma saudade boa.
Tem também a falta da escola, da Camila que ia ser madrinha dos meus filhos e eu dos dela. Essa talvez seja mesmo uma saudade boa. Não vamos ser madrinhas de coisa nenhuma, mas ainda assim foi e será sempre forte e verdadeiro.

Acho que começo a entender o que Mariliz quis dizer com "saudade boa não dói". Quando temos a certeza do reencontro, a certeza da reciprocidade, de continuidade da história e de que um dia aquela saudade vai passar, podemos chamá-la de "saudade boa". O que sinto com relação ao meu avô é um abismo realmente sem fim. É falta, é vazio, é incerteza do reencontro, é esforço diário pra não esquecer nenhum detalhe do que foi vivido. Essa saudade dói e de boa ela não tem absolutamente nada.

O que sinto pelo meu namorado, com quem divido o hálito duvidoso de todas as manhãs e está agora a 3.500km de distância de casa, é algo completamente oposto. Sinto falta dele, da forma como ele lida com minhas loucuras, da loucura compartilhada, da companhia, da rotina, e até da bagunça que ele faz e do furacão que ele causa em cada cômodo que entra tirando tudo do lugar. Mas eu sei que no próximo domingo, quando eu entrar no carro, será a última vez em que vou voltar sozinha. Sei que ele vai voltar comigo, que vai encher a casa de novo - de calças pelo chão e cuecas por todos os lados -, de amor, de presença, de amizade. Ele vai voltar e vai preencher com o excesso de vida que ele exala, tudo o que hoje está um pouco mortinho, sem corzinha, desanimadinho, assim mesmo, no diminutivinho. Tudo encolhidinho de saudade.

Eu não preciso do meu namorado para viver, nem da Camila e, racionalmente falando, não preciso do meu avô. E é exatamente isso que me faz amá-los tanto, cada um de sua maneira. Viver com todos eles foi uma escolha e isso dá um peso imensurável ao meu amor. Escolhi com quem me relacionar, escolhi minha amiga na escola e escolhi amar meu avô a qualquer distância e apesar dela.

Saudade boa ou não, doendo pouco ou muito, todas me fazem crescer e, isso já é um grande negócio.



Ps.: Amor, se não voltar logo eu vou vender seu PS4, seus jogos e aquele quadro do Coringa e vou gastar tudo com o cachorro que eu vou enfiar em casa, sem te consultar.
Com amor,

Cathe - a dona do cachorro que alguém vai abandonar na nossa porta por pura maldade sem eu pedir. Sem eu pedir (em negrito), eu juro. 

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